domingo, 28 de agosto de 2016

a superfície da mesa como uma

minúscula cosmogonia: a chávena
de café e a garrafa das águas.
se olharmos com atenção vemos
também vestígios: marcas de copos,
resquícios de outras conversas,
a definitiva teoria sobre o belo. que
desencanto! fecho o caderno
vou para a porta, puxo
do cigarro mas é outro artificio
literário: um cigarro pensativo.

*

se a tua mão falasse
não seria mão mas boca.
uma boca com dedos, memória
a leveza do amor. uma boca
que dá a mão, dá a luz
que se une a outra mão.
(duas mãos que inauguram
um olhar sobre a terra).
se a tua mão fosse livro
não seria mão mas início
de história, a nossa história.
a tua mão é tudo isto:
boca, amor, olhar, o sustento
da nossa história. a tua mão
é também beijo, vento
alegria, o próprio mundo
quando não estou na tua mão.


Rui Tinoco (Portugal)
Psicólogo, vive no Porto. Tem publicados dois livros de poesia: O Segundo Aceno (Edições em Pé, 2011) e Era Uma Vez o Branco (Volta d'Mar Edições, 2013). Participou em diversas revistas literárias. Mantém o blogue Ladrão de Torradas: http://ladraodetorradas.wordpress.com/

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Poema grande...


Sei de um poema.

Anda por aí

Nesta página perdido,

E ninguém o vê.
Estas letras vão cobri-lo
E ele (des)aparecerá
Porque, as letras,
Mostram os estilos que cobrem...
É um poema grande,
Grande até ao fim do caderno
Sem letras, sem nada,
Simplesmente um poema
GRANDE...
Estas letras falam dele...

10 de abril de 1987

Mário Adão Magalhães
«Sou filho de Joaquim Ribeiro de Magalhães e de Conceição Mendes, nasceu em Margaride, Felgueiras a 4 de maio de 1965.
Comecei a escrever poesia aos 12 anos e sou jornalista profissional.
Tenho coincidências com Miguel Torga, com quem tive correspondência postal e por ele fui recebido».

(Publicado em Elipse 4)

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Haikus Contados

I

Os países que morrem
não agradecem
serviços emprestados.

II

Só por ver teu adentro
derreteria
lume de neve negro

III

Queimamos lenha líquida
com ossos de língua,
e a morte é feliz

IV

Galiza, verde impais
que voa nas nuvens.
Cai a chuva e não molha.

V

Peitos de mulher fria
que esta montanha
torna em fumo sem calor.

VI

Vazia é a consciência
só quando eu olho
frente a frente aos teus olhos.

VII

Neve nas janelas que
fecham o interior.
Não abrem desde fora.

VIII

Anjos e demos lutam
dentro do peito.
Eu só aguardo vê-los.

IX

Tu, verdugo inocente
das alvoradas.
Sangue mole e corrupto.

X

Estrelinha da manhã,
essa que vela
com fios de cordura.

XI

Galiza: Somos luz na nevoa
no negro inferno
das borboletas ruins.

XII

São sete assinaturas.
Calor humano
no meu cérebro mortal

XIII

O Novelo de noite
húmida.
E fecha a trovoada.

XIV

Sou o miradouro seco
do teu coração.
Lentamente apaga o sol.

XV

São claros os teus olhos
como as candeias
que me atam ao vento

XVI

Sei que és um abismo
negro, sem fundo,
mas é que eu sei voar.

XVII

Eu não sei dizer que não
na noite clara,
quando vates as asas.

XVIII

Foram sete as noites
nas que te pintei.
A cor perdura firme.

XIX

Por ti me fiz silêncio
na tua ausência.
Mas as lágrimas falam.

XX

Em mim pousache firme
as asas brancas.
Mas chegou o destino

XXI

Quando li o teu livro
de amor perfeito,
tiraram-me o coração.

XXII

Li o teu livro de amor
perfeito e limpo.
Gromo na carvalheira.

XXIII

Dormirei no teu peito
de branco algodão,
quando sonhe com voltar.

XIV

Perfume e orvalheira
após a chuva.
Nunca houve sequidão.

XXV

És um caminho longo
de coios duros.
Mas vejo o horizonte.

XXVI

Nunca tive o teu ser
que transparece.
Eras fume fantasmal.

XXVII

Uma palavra tua
foi suficiente.
E o riso já nasceu.

XVIII

O silêncio instalou-se
em mim de manhã.
E durou toda a vida.

José Manuel Barbosa Álvares (Galiza)
Professor de Educação Física. Fez também estudos de História na UNED. Sócio da AGAL, ex-membro do Conselho Consultivo do Movimento Internancional Lusófono, faz parte do Clube
d@s Poetas Viv@s. Ex-diretor administrativo do Instituto Galego de Estudos Célticos. Académico de Número da Academia Galega da Língua Portuguesa. Tem publicado artigos na jornal La Region, na_revista Agália, no Portal Galego da Língua e em MundoGaliza.com. Publicou o Curso Prático de Galego (AGAL, 1999), Âmago/Mâgoa (Baia, 2002 - Em parcería com Roi Brâs), Bandeiras de_Galiza (AGAL, 2006) e Atlas histórico da Galiza (Edições de Galiza, 2008). É editor do blog Desperta do teu sono: http://despertadoteusono.blogspot.com.
(Publicado em Elipse 4)